Brasil pode ficar 100 bilhões mais pobre este ano

16 de março de 2009

O mundo pode ficar US$ 4,03 trilhões mais pobre neste ano. Isso equivale a apagar do mapa-múndi a China, o país que apresenta o mais impressionante crescimento econômico nas últimas duas décadas. Esse brutal desaparecimento de riquezas globais ocorrerá se o Produto Interno Bruto (PIB) de todos os países somados cair 2% em termos reais, estimativa feita pelo presidente do Banco Mundial (Bird), Robert Zoellick. Se a economia doméstica também recuar 2%, hipótese que ganhou adeptos diante dos péssimos indicadores anunciados recentemente, o Brasil terá uma perda total de R$ 100 bilhões. Com esse dinheiro, 2,5 milhões de casas populares poderiam ser construídas, o que reduziria o déficit habitacional em um terço.


Embora as perdas trilionárias assustem, o pior efeito da recessão mundial será o drama humano de quem perderá a vida ou o emprego. Em entrevista ao jornal britânico Daily Mail, Zoellick disse estar preocupado com os reflexos da crise internacional nas nações mais pobres. Numa previsão sombria, ele afirmou que até 400 mil crianças devem morrer de fome e de doenças provocadas pelo empobrecimento dos seus países. No Brasil, o desemprego nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pode saltar de 8,2% para 13%, igualando o recorde obtido em alguns meses de 2003 e 2004. O número de desocupados passaria dos atuais 1,890 milhão de pessoas para 2,996 milhões.


As estimativas, feitas pelo economista-chefe da RC Consultores, Marcel Pereira, levaram em conta o pior cenário imaginado até agora para as economias mundial e nacional. Um número cada vez maior de analistas adere ao pessimismo. A julgar pelos últimos números anunciados nos principais países sobre produção industrial, consumo das famílias, vendas no varejo, faturamento do setor financeiro, investimentos e comércio exterior, a tendência é mesmo que o mundo dê vários passos para trás. Segundo Zoellick, seria a primeira recessão global desde os anos 1930. De 1961 para cá, os piores resultados foram em 1975 (0,93%) e 1982 (0,89%), depois dos dois choques do petróleo (veja gráfico).


“É bastante provável que a economia mundial caia 2% em 2009. Os Estados Unidos vão diminuir 2,5%, a Índia vai crescer só 3% e a China, no máximo 4%. O ano que vem também estará comprometido pela crise, mas num grau menor. A situação deve melhorar um pouco, mas sem nenhuma guinada”, afirma Pereira. Na visão dele, ainda há tempo para reduzir os danos em 2010. Tudo depende de como os Estados Unidos contornarão os seus graves problemas, em especial o rombo trilionário no sistema financeiro, o desemprego crescente, a queda no consumo e as dívidas imobiliárias.


O economista Antônio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP, acredita que é “inevitável” uma contração mundial neste ano, pois os países desenvolvidos estão no buraco e os emergentes não conseguirão compensar as perdas. Ele calcula o encolhimento entre 0,5% e 1%, mas não acha impossível a previsão de Zoellick se concretizar. “Os prejuízos continuarão aparecendo nos próximos meses. O país que conseguir escapar da recessão neste ano pode se considerar um verdadeiro vitorioso”, diz.


Segundo esse critério, a retração de 3,6% anunciada pelo Brasil na semana passada se transforma em uma queda abrupta de 15,2%. Diante desse dado e dos resultados da produção industrial de janeiro, o economista Julio Sérgio Gomes de Almeida não titubeia: o país vai entrar em recessão, com o PIB diminuindo 2% neste ano. Nas suas contas, o ano já começou negativo em 1,5% e a atividade não terá condições de tirar esse atraso. “Durante meses, o governo disse que a crise não afetaria o país. Os números mostram que isso foi uma abstração”, diz Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do governo Lula.


Se a previsão de Almeida estiver correta, esse será o primeiro recuo no PIB brasileiro desde 1992, quando o indicador diminuiu 0,54%. De 1961 para cá, a economia registrou desempenhos negativos por cinco vezes. O melhor resultado se deu em 1973 (13,97%), em pleno “milagre brasileiro”, quando o crescimento chegou a dois dígitos em cinco anos. Na avaliação da Tendências, o resultado deste ano estará léguas distante desses recordes, mas ainda ficará no terreno positivo.


“Para passar disso, o PIB terá que crescer pelo menos 1% em cada um dos três últimos trimestres do ano. Isso é difícil. Se o cenário, continuar piorando, as chances de o resultado ficar negativo são grandes”, afirma a economista Marcela Prada, da Tendências. A projeção da consultoria para o primeiro trimestre é de 0,9% negativo. Marcel Pereira, da RC Consultores, acredita que a economia brasileira vai ficar “no zero a zero” neste ano. “Isso já é muito ruim”, diz.


Criticado por ter insistido por muito tempo na teoria da “marolinha”, enquanto a crise fazia estragos na indústria nacional, o governo tem muito pouco a fazer para estancar as perdas. Na visão de Pereira, o Banco Central (BC) precisa continuar fazendo “cortes profundos” na taxa básica de juros (Selic), aumentar a eficiência das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e encarar reformas estruturais, como a tributária.


Fonte: Correio Braziliense