ACORDO BRASIL-EUA ABRE SIGILO FISCAL DE CONTRIBUINTES

17 de outubro de 2008

É inconstitucional o acordo bilateral que Brasil e Estados Unidos firmaram em 20 de março de 2007, permitindo a funcionários de ambos os países o acesso irrestrito a dados fiscais e bancários de investigados sob suspeita de fraudes tributárias. A opinião é de especialistas ouvidos pela revista Consultor Jurídico. O acordo, de 13 artigos e oito páginas, foi assinado pelo embaixador dos EUA no Brasil, Clifford Sobel, e pelo ex-chefe da Receita Federal do Brasil, Jorge Rachid.
No caso do Brasil, ficam sujeitos aos dispositivos do acordo os suspeitos de fraudes ao IRPF e IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Física e Imposto de Renda Pessoa Jurídica), IPI (imposto sobre produtos industrializados), IOF ( Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros), ITR (imposto sobre a propriedade territorial rural), PIS (Contribuição para o Programa de Integração Social ), COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).
O acordo bilateral autoriza as autoridades fiscais dos dois países a fornecer, por telefone e informalmente, uma senha à autoridade do outro país para acessar os dados do investigado.
Para quatro advogados consultados pela ConJur, o acordo viola o parágrafo 1º do artigo 145 da Constituição Federal do Brasil, pelo qual o poder de fiscalização tributária de nascidos em território brasileiro deve ser exercido, exclusivamente, por autoridades brasileiras.
Destacam também que o artigo 49, inciso 1º, combinado com o artigo 84, inciso 8º, da Constituição, estabelece que cabe ao Congresso Nacional resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. Da mesma forma “compete ao Presidente da República celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos ao referendo do Congresso Nacional”.
Os artigos 5º e 6º do acordo são apontados como os mais inconstitucionais. O artigo 5º, por exemplo, descreve em seu parágrafo 1º que o acordo faculta “informações que devem ser trocadas sem satisfação” às partes investigadas, desde que o investigador “necessite das informações para seus propósitos de tributação”. O parágrafo 2º determina que os investigadores podem solicitar os dados do investigado mesmo “que não estejam necessitando, naquele momento, dos dados para seus propósitos de taxação”. O parágrafo 3º estipula que podem ser apreendidos para investigação objetos como “registros, livros, papéis, gravações e outras propriedades tangíveis”. A letra ‘e’, do mesmo parágrafo 3º, faculta acesso a “informações de posse de bancos, outras instituições financeiras, e qualquer pessoa, incluindo procuradores e depositários, que atuem em agências ou com capacidade fiduciária”.
No Congresso
Em dezembro de 2007, o Executivo enviou ao Congresso um Projeto de Decreto Legislativo para aprovar o acordo. O texto já foi aprovado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados. O deputado Ciro Gomes (PSB-CE), relator do projeto na comissão, votou a favor da sua ratificação.
“Além de ser eficaz instrumento no combate à evasão fiscal internacional, por certo constitui-se em um importante passo na celebração de um futuro acordo para evitar a dupla tributação internacional entre o Brasil e os Estados Unidos”, argumentou o deputado, que foi acompanhando pelos colegas.
Já na Comissão de Constituição e Justiça, as chances de o projeto ser aprovado são menores. O relator Regis de Oliveira (PSC-SP) apresentou em setembro parecer afirmando que o texto é inconstitucional. Pela sua relevância, o assunto deveria ser considerado em tratado e não em acordo, afirma o deputado. Ele entende ainda que esse tipo de acordo só pode ser assinado pelo presidente da República e não por um secretário da Receita.
“Como as interpretações e práticas determinadas pelo Acordo são ‘confidenciais’ (Art. IX), não haverá possibilidade real de controle das atividades objetivadas pelo Acordo em solo pátrio, seja das várias atividades das autoridades fazendárias brasileiras, seja das práticas dos funcionários do governo estrangeiro”, argumenta o deputado.
Segundo Regis de Oliveira, o acordo, além de inconstitucional, é uma “indevida e desnecessária cessão da Soberania brasileira, o qual seriamente compromete Direitos e Garantias Fundamentais dos cidadãos brasileiros e de suas empresas, assegurados pela Constituição da República, sem real evidência de atenção aos ditames que regem a Administração Pública em geral e Tributária em particular (art. 37, caput, e inc. XXII da CF) ou ao interesse público nacional”.
Revista Consultor Jurídico, 15 de outubro de 2008
(FONTE: CONSULTOR JURÍDICO)